Por que me fitas com olhos que não me vêem ?



“Por que me fitas com olhos que não me vêem ? ” pergunta Shakespeare em MacBeth. Já eu, pergunto: Você sabe ouvir as pessoas para vê-las melhor?

Nós olhamos mas não conseguimos ver bem quem está na nossa frente porque não sabemos ouvir. Com os olhos vemos o que está fora, mas é com os ouvidos que ‘vemos’ o que está dentro.

Quem não sabe ouvir, não conhece bem ninguém e digo isso de carteirinha.

Com o tempo aprendi que não era um diploma, nem tampouco os conceitos teóricos as ferramentas suficientes para produzir conhecimento a respeito de alguém. O essencial para se conhecer realmente o outro e com isso produzir autoconhecimento é saber escutar. Uma habilidade cada vez mais rara entre as pessoas.

Ué?! Como assim? Se não nascemos com problemas auditivos, nascemos com essa capacidade não é?

Sim, nós ouvimos e somos capazes de ouvir muito bem, mas ao longo da vida desaprendemos a escutar de forma simples, mas principalmente desaprendemos a escutar sem fazer julgamentos, sem dar nosso parecer (em negrito e sublinhado!). Nesse momento convoco Rubem Alves com um trecho belíssimo de seu livro ‘O amor que ascende a lua’ para me ajudar a fazer entender:

“O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranqüila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: “Se eu fosse você”. A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção.”

Tem gente que não deixa o outro falar, são aquelas com olhos de raio x que parecem saber tudo o que ocorre do lado de dentro das pessoas e já vão logo dizendo o que acham e o que deve ser feito, uma pena, essas pessoas não sabem escutar ninguém, nem elas mesmas e pior não devem seguir nenhum dos conselhos que oferecem. É preciso saber ouvir as pessoas e a ouvir a si mesmo. Mas essa não é uma tarefa fácil.

Ser humano é um ser interessante, pois nunca foi e nunca será auto suficiente e independente dos outros seres humanos, estamos amarrados para sempre. Precisamos do outro para quase tudo inclusive e especialmente para saber quem somos. Autoconhecimento se faz acompanhado ! Nesses anos trabalhando como terapeuta aprendi que só através de uma escuta sem julgamento é que as pessoas conseguem se revelar. Para deixarmos o outro ‘vir’, é preciso ouví-lo de maneira especial.

De ouvidos e olhos bem abertos procuro aquilo que está por trás, através, entre, no fundo, procuro fazer com que a pessoa use seus olhos de dentro e veja o que está escondido, disfarçado, perdido, desorganizado, o que é frágil, o que poderia ser criticado, avaliado, julgado, mas que ali, naquela conversa é simplesmente ouvido e por isso pode ser falado, por isso é passível de ser revelado. É assim que podemos conhecer e adentrar no mundo particular das pessoas, é assim que podemos oferecer um lugar seguro para que ocorra o “vir a ser”. É através de uma escuta bonita que se desatam nós e que de fato encontramos e damos a chance para aquilo que é humano…

Preste atenção em como você tem ouvido as pessoas, principalmente aquelas que você gosta e que compartilham a vida com você, não ofereça nada além daquilo que existe nelas mesmas, ofereça-lhe uma oportunidade de ser ouvida, de ser vista por dentro através da sua escuta, depois disso se ela pedir um conselho, ofereça, mas pergunte antes, às vezes as pessoas só querem compartilhar, só querem ser ouvidas, se mostrar, aparecer, ser…

Fonte: O Rumo

Façamos desta semana boas escutas...

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